Especialistas em direito digital e segurança apresentaram sugestões ao Projeto de Lei 4939/20 durante audiência pública realizada nesta terça-feira (8) na Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados. O projeto, que tramita em regime de urgência, estabelece diretrizes para a obtenção e admissibilidade de provas digitais em investigações e processos penais.
Questões terminológicas e técnicas
O professor de direito da USP, Spencer Toth Sydow, apontou problemas na nomenclatura utilizada no projeto, sugerindo termos mais precisos como "dados digitais" em vez de "dados eletrônicos" e "dispositivo informático" no lugar de "programa de computador". Ele também destacou a ausência de garantias sobre a integralidade dos dados: "A ausência da integralidade faz com que nós, advogados, que temos o direito de observar o que foi analisado, não compreendamos todo o contexto probatório em que os fatos estão inseridos".
Em contrapartida, o promotor de Justiça Sauvei Lai, do Rio de Janeiro, defendeu que a terminologia do projeto está alinhada com a convenção de crime cibernético da ONU, aprovada no final de 2024: "Muitas expressões, inclusive criticadas por outros autores aqui, foram expressões adotadas pela convenção da ONU".
Segurança e privacidade
O perito digital Leandro Morales classificou o projeto como "um divisor de águas", ressaltando que o valor de dispositivos como celulares está mais nos dados que contêm do que no bem material. Ele sugeriu a proibição de provas de captura de tela e a criação de um registro nacional de laboratórios e peritos forenses credenciados, especialmente considerando os desafios trazidos pela inteligência artificial.
Marina Meira, coordenadora de Políticas Públicas da organização Derechos Digitales, alertou para a necessidade de salvaguardas contra vigilância excessiva. Ela também destacou que menos de 10% das vítimas de disseminação de imagens íntimas fazem denúncia, defendendo que as plataformas implementem ferramentas específicas para combater esse tipo de violação.
Preocupações com pequenos provedores
Jamil Assis, do Instituto Sivis, expressou preocupação com a obrigação de preservação de dados por um ano, afirmando que pequenos provedores não têm condições nem segurança para isso: "Não tem ambiente controlado mencionado, acesso restrito, salvaguarda de segurança. Isso é um risco de privacidade". Ele também apontou que o projeto permite a análise de dados de pessoas não investigadas, o que violaria a Lei Geral de Proteção de Dados.
O deputado Hugo Leal (PSD-RJ), autor do projeto, afirmou que as contribuições ajudarão a construir um texto consensual: "Várias dessas contribuições vão colaborar para a gente chegar ao objetivo de ter um texto que seja consensual e possa levar a Plenário". O parlamentar justificou a proposta pela necessidade de regulação adequada para evidências digitais, considerando que legislações como o Marco Civil da Internet e a LGPD não trouxeram definições suficientes nessa área.
O projeto tramita em caráter de urgência e pode ser pautado para votação em Plenário a qualquer momento.