A Câmara dos Deputados realizou nesta terça-feira (8) uma sessão solene em celebração ao 21º Acampamento Terra Livre, que reúne cerca de 9 mil lideranças indígenas em Brasília até sexta-feira. Durante o evento, representantes de diversos povos originários aproveitaram o espaço para reivindicar a demarcação de seus territórios e protestar contra o marco temporal.
A luta pela representatividade indígena no Congresso
A deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), autora do pedido para realização da sessão, destacou a importância da chamada "bancada do cocar" e lembrou que foram necessários mais de 30 anos após a eleição do primeiro parlamentar indígena, Mário Juruna Xavante, para que uma mulher indígena chegasse à Câmara – a atual presidente da Funai, ex-deputada Joênia Wapichana.
"Este é o Congresso Nacional que nós sonhamos para o futuro, este é o Congresso de um Brasil que começa por nós. Nós somos os primeiros brasileiros e, no entanto, somos os últimos a chegar ao Congresso Nacional", afirmou Célia Xakriabá.
Cacique Raoni e a defesa dos territórios indígenas
Um dos momentos mais marcantes da sessão foi o discurso do cacique Raoni Metuktire, liderança histórica do povo Kayapó, de 93 anos. Falando em sua língua nativa, ele conclamou os povos indígenas a continuarem na luta pela defesa de seus territórios e de seu modo de vida: "Há muito tempo, comecei a ter esse papel para defender o nosso povo e até hoje eu luto para defender o nosso direito, para que haja uma terra, para que a nova geração tenha seu próprio modo de vida dentro do território. E é isso que eu peço para vocês, que continuem lutando, que tenham força".
Críticas ao marco temporal
Tanto Joênia Wapichana quanto a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, criticaram o marco temporal, estabelecido por lei aprovada pelo Congresso, que determina que os povos indígenas têm direito apenas à posse das terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988. A constitucionalidade da norma está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal.
"Nossas raízes são profundas, pois tocam uma ancestralidade de cada homem, de cada mulher que nasceu no chão deste Brasil tão grande e diverso. A luta dos povos indígenas é a mãe de todas as lutas, e por isso nós seguimos falando 'não' à mineração nos territórios indígenas, 'não' ao marco temporal, nunca mais o Brasil sem nós", declarou a ministra.
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) também se manifestou contra o marco temporal, classificando-o como "uma jogada dos ruralistas" e defendendo o artigo 231 da Constituição, que garante aos indígenas o direito sobre as terras que ocupam tradicionalmente.
De acordo com a ministra Sonia Guajajara, o Acampamento Terra Livre é a maior mobilização indígena do mundo. O Brasil conta hoje com mais de 305 povos e, segundo o último Censo do IBGE, a população indígena quase dobrou desde 2010, chegando a quase 1,7 milhão de pessoas, que ocupam cerca de 14% do território nacional.
Lei estabelece marco temporal para terras indígenas, mas o tema ainda vai ser julgado no STF