A continuidade delitiva, prevista no artigo 71 do Código Penal, foi concebida para racionalizar a punição de condutas que, embora praticadas de forma independente, estejam inseridas em um mesmo contexto delitivo. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu critérios objetivos para sua aplicação, equilibrando a proporcionalidade da pena com a gravidade dos crimes sequenciais.
Critérios para cálculo da pena na continuidade delitiva
A jurisprudência do STJ consolidou que o aumento da pena é determinado pelo número de crimes cometidos, dentro do intervalo legal de 1/6 a 2/3. Aplicam-se as seguintes frações: 1/6 para duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações.
Este parâmetro foi utilizado pela Quinta Turma no julgamento do HC 989.487, mantendo a fração de 2/3 de aumento para uma acusada que praticou 11 furtos em continuidade delitiva.
Casos especiais: estupro de vulnerável
Em crimes de estupro de vulnerável, a Terceira Seção fixou tese no Tema 1.202 dos recursos repetitivos, permitindo a aplicação da fração máxima de majoração (2/3) mesmo sem a delimitação precisa do número de atos sexuais, desde que o longo período e a recorrência das condutas permitam concluir que houve sete ou mais repetições.
Requisitos temporais e espaciais
O STJ utiliza como parâmetro o intervalo de 30 dias entre as condutas criminosas para caracterizar a continuidade delitiva. Em caso relatado pelo ministro Sebastião Reis Júnior, foi afastada a aplicação do instituto quando os crimes ocorreram com intervalo de mais de dois anos.
Quanto ao aspecto espacial, a Quinta Turma, no julgamento do REsp 1.849.857, manteve a continuidade delitiva em crimes de tráfico ocorridos em municípios próximos, desde que em semelhantes condições de execução e tempo.
Unidade de desígnios e distinção de institutos
A falta de unidade de desígnios afasta a continuidade delitiva, como decidiu a Quinta Turma no HC 936.829. Crimes que não fazem parte de um mesmo plano caracterizam habitualidade criminosa, impedindo o reconhecimento do crime continuado.
Por fim, a Sexta Turma pacificou a distinção entre os institutos da pena-base e da continuidade delitiva, permitindo a valoração da mesma circunstância fática sob dois aspectos distintos, sem infringência ao princípio do ne bis in idem.