Em audiência pública realizada nesta terça-feira (6) na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados, representantes do setor elétrico brasileiro apresentaram visões conflitantes sobre os impactos do chamado "fluxo reverso" - fenômeno causado pela injeção de energia excedente da micro e mini geração distribuída nas redes de distribuição.
O que é o fluxo reverso e por que gera preocupação
O fluxo reverso ocorre quando consumidores com geração própria (principalmente solar) injetam seu excedente energético na rede, fazendo com que a eletricidade flua no sentido contrário ao tradicional - dos consumidores para as subestações. Segundo Marcos Madureira, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), a infraestrutura atual não foi dimensionada para suportar o volume crescente desse tipo de energia.
"Esses gargalos existem. Eles precisam ser tratados com seriedade", afirmou Madureira, defendendo que o problema é técnico e não mercadológico. Dados da Aneel revelam a dimensão do fenômeno: são realizadas oito novas conexões à rede elétrica a cada minuto no país.
Setor solar denuncia barreiras ao acesso
Por outro lado, Bárbara Rubim, vice-presidente de geração distribuída da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), acusou as distribuidoras de usarem o argumento do fluxo reverso para negar o acesso à rede elétrica. Segundo ela, mesmo após três anos da aprovação do marco legal da geração distribuída (Lei 14.300/22), as distribuidoras continuam dificultando o direito de acesso dos consumidores.
Rubim criticou especificamente a aplicação da Resolução Normativa 1.098/24 da Aneel, que estabelece três cenários onde fica dispensada a análise de inversão de fluxo. "Qualquer configuração de geração própria de energia que fuja a essas três hipóteses passou a ser negada pela distribuidora", denunciou.
ONS identifica situações críticas em nove estados
Fernando Silva, gerente executivo do Planejamento Elétrico do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), trouxe uma posição intermediária ao debate. Segundo ele, o fluxo reverso não é um problema sistêmico e pode ser resolvido, mas há locais onde a situação está no limite. Um relatório do ONS divulgado em fevereiro apontou riscos de sobrecarga em nove estados: Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Rondônia.
O deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), proponente da audiência, criticou o que chamou de "delírio regulatório" da Aneel e defendeu uma solução negociada entre as partes. Atualmente, o segmento de micro e mini geração distribuída possui capacidade instalada de 39 gigawatts (GW), equivalente a quase três usinas de Itaipu, com 3,5 milhões de unidades consumidoras gerando sua própria energia.